Livros: diferentes versões dividem tendências

Escolhas

Enquanto alguns preferem as telas, outros sentem conforto

na visão que só o livro físico proporciona

Alessandra Bernardi

   De tempos em tempos, uma discussão reaparece e assombra os amantes dos livros: o que é melhor, ler um livro físico ou um livro digital? Embora a palavra escrita faça parte do nosso cotidiano há aproximadamente seis mil anos, e que por meio dela, o ser humano tenha desenvolvido formas de fazer registros da sua passagem pelo planeta para expandir conhecimentos, experiências, história, leis e divulgação de ideias, sua forma de consumo passa por rápidas transformações. Mas, em meio a tantas discussões, estão os grandes personagens desta história: os leitores. E, é essa parte que vale contar.

    Apaixonada pela leitura, Diovana Frizon, 20 anos, conta que iniciou ainda pequena sua relação com os livros. Por influência do pai, que sempre lia histórias para ela antes de dormir e com as diversas maletas de livros que eram vendidas na escola. Hoje, com uma coleção de mais de 200 livros que variam de gêneros, tendo em sua maioria, fantasia e terror, segue com esse hábito que a fez escolher biblioteconomia como profissão.

    Quando questionada sobre a preferência por livros físicos ou digitais, ela prontamente responde:  “Eu sinto que todo leitor tem um apego com seus livros físicos. Abrir um livro novo, folhear, sentir o cheiro… é como se fosse uma espécie de "ritual". Além disso, sentir o livro na mão, e conseguir ver o progresso da leitura, faz parte da experiência de ler.”




    






Wood

Foto: Internet/Reprodução

“Livros contam mais que uma só história.”

–Diovana Frizon

    Quanto à experiência com a leitura, os leitores se dividem. Enquanto alguns preferem as telas, outros sentem conforto na visão que só o livro físico proporciona. Segundo ela, os livros podem ser passados de geração em geração, tornando-se, assim, “livros que contam mais que uma só história.”

    Ainda que exista esse receio sobre o tempo de vida do livro impresso, as pessoas continuam comprando e lendo esses livros. Uma pesquisa recente divulgada pelo Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel), durante o 7º Painel do Varejo de Livros no Brasil, apontou o aumento de 48,5% nas vendas de livros, o que equivale a 28 milhões de unidades vendidas no primeiro semestre do ano de 2021.

    Ao ser  questionada sobre a possibilidade dos livros impressos acabarem, ela responde: “Os livros físicos, assim como nós, não são eternos, e com o tempo vão se deteriorando, mas só fisicamente. Acredito que o livro impresso nunca vai acabar. Estamos imprimindo livros há mais de 550 anos e ainda os usamos para estudar, nos divertir e presentear quem amamos.







     








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I don't need sponsors,
I surf better when I'm broke anyway.

Dave Parmenter Surfer

Foto: Diovana Frizon/Arquivo Pessoal

Espero que essa tradição nunca acabe.”
   E de fato, além dos apaixonados por livros e pela leitura, a continuidade do livro impresso no mercado se deve também aos autores e editoras que vêm investindo cada vez mais em inovação, lançando livros de papel integrados às mídias digitais. Por isso, a história segue.











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A leitura além do livro

Livro físico ou o digital?

A Covid-19 pode ter afetado as bibliotecas, livrarias e outros espaços dedicados a livros, porém, por outro lado, as leituras digitais foram impulsionadas durante esse período e muitas pessoas passaram a ler virtualmente. Ao contrário da maioria, a jornalista Alessandra Teixeira, 24 anos, lê e-books há cerca de oito anos. As restrições impostas pela pandemia foram apenas estímulos para que ela passasse a ler ainda mais por meio de um dispositivo eletrônico. Em 2020, ela adquiriu o Kindle, aparelho leitor de livros digitais da multinacional Amazon. “Eu gosto bastante de ler no digital, claro que eu prefiro livro físico, mas me acostumei muito cedo a ler no virtual. Então, quando eu percebi que o Kindle veio para ficar e que era um investimento válido, eu vi que valia a pena”, comenta. Ela reconhece que, assim como os livros físicos, o Kindle também tem sua singularidade e é insubstituível. "Dependendo do

livro eu não consigo embalar [a leitura] no físico, e aí quando eu leio no Kindle funciona. Então varia bastante, mas no momento eu prefiro ler livros físicos, pelo cheirinho do livro, pela experiência de passar as páginas, mas a praticidade do Kindle é inegável. Ele é prático”, argumenta.
   Os dois tipos de leitura oferecem a praticidade de estar em qualquer lugar e carregar consigo um livro, no entanto, o Kindle se destaca por ser um aparelho leve e que disponibiliza diversas opções de obras de uma só vez. Outras vantagens são que o dispositivo oferece recursos para grifar o texto, escolher o tamanho da fonte e cor das páginas, além de possibilitar tomar notas e traduzir palavras. O Kindle disponibiliza acesso aos e-books gratuitos, porém também há os títulos que são pagos. Por isso, existe a assinatura mensal do Kindle Unlimited, com um catálogo variado de e-books, que podem ser lidos a qualquer momento.







Ana Clara Nazario

Foto: Alessandra Teixeira/Arquivo Pessoal

    Com toda essa tecnologia inserida no mundo da leitura, dúvidas surgem sobre o futuro dos livros físicos, mas Alessandra defende: “Eu acho que o livro nunca vai ser extinto. O Kindle é maravilhoso e eu só vejo vantagens. Eu não consigo ver nada que não seja bom, mas nada nunca vai substituir o livro. Pessoas que gostam de ler livros físicos gostam do cheiro, da sensação de tocá-lo, da capa, do passar de páginas. Então eu acho que esse tipo de leitura nunca vai acabar”.
   A jovem jornalista segue uma regra imposta por ela mesma: quando ela lê um livro pelo Kindle que gostou muito, ela compra a versão física para ter na sua estante. Quando se trata de uma obra nacional, ela compra o livro impresso de qualquer maneira, como forma de apoio à literatura brasileira.     Alessandra começou a ser inserida ao mundo da literatura aos quatro anos de idade por uma de suas tias, desde então os livros fazem parte de sua vida. Só no ano passado, ela leu 93 livros, sendo 80% deles no Kindle.
   Ao todo, Alessandra tem cerca de 500 livros físicos em sua casa. Seus gêneros preferidos são suspense e mistério, embora suas autoras favoritas sejam Colleen Hoover, escritora de romance e ficção para jovens adultos, e Paula Pimenta, escritora de literatura adolescente.












Nada nunca vai substituir o livro. Pessoas que gostam de ler livros físicos gostam do cheiro, da sensação de tocá-lo, da capa, do passar de páginas.

–Alessandra Teixeira

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Fanfics: o novo caminho de leitura para os jovens

Histórias ficcionais escritas por fãs conquistam leitores
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   Imagine que o apresentador Fausto Silva vive uma história de romance com a jovem cantora e atriz, Selena Gomez. Eles fazem parte, na verdade, de um universo fictício – em que os dois são apaixonados um pelo outro. Tudo começou quando em 2014, durante seu programa, Faustão mandou vários recados, e um deles foi para Selena Gomez. A situação viralizou na internet e muitas pessoas começaram a imaginar como seria um relacionamento entre os dois, inventando casos e fazendo memes. Até que surgiu uma fanfic sobre Faustão e Selena, que se tornou viral na Internet e que rende comentários e piadas sobre os dois como casal até hoje. Esse é o poder de imaginação e impacto das fanfics.
   A palavra fanfic, abreviada da expressão inglesa fanfiction, que significa “ficção de fã” na tradução literal para a língua portuguesa, trata de uma história ficcional, criada por um fã, que pode ser baseada em séries, obras literárias, filmes, animes,

cantores, atores, entre outros. A estudante Madeleine Reis, 23 anos, começou a ler ainda criança e sempre foi apaixonada por romances, assim como pelo mundo do cinema e música. Desde a infância, ela mantém um fã-clube no Twitter para falar de seus ídolos, como por exemplo, o Justin Bieber, o grupo One Direction e as sagas Harry Potter e Jogos Vorazes. “Eu leio fanfics desde que eu tenho 10 anos, então já são quase 13 anos de carreira como fã de fanfic”, ela ri. Madeleine lembra da primeira fanfic que acompanhou à risca semanalmente e aguardava ansiosa por cada novo capítulo: Soul Rebel, que tem como personagem principal Justin Bieber.
   Ao mesmo tempo que é fascinada por esse universo fantasioso, Madeleine gosta da proximidade com a realidade que as fanfics podem trazer, tratando-se de uma história interativa. “Isso me chamou bastante atenção por ser uma leitura com a qual eu poderia me identificar. Eu coloco o meu






nome com o nome das pessoas que são próximas a mim, o que acaba tornando a leitura muito mais verdadeira. Consigo tornar real algo que acontecia só na minha cabeça”, comenta. E ela ainda acrescenta: “Lembro que, na adolescência, ler fanfic era meu momento de paz. Me ajudava nos momentos difíceis em que eu estava estressada ou chateada, e eu podia literalmente entrar naquele mundo e ver meu nome socializando e interagindo com algum personagem que eu gostava muito”.
   Com isso, a vontade de Madeleine de navegar pelo mundo da imaginação se expandiu com o desejo de criar suas próprias fanfics. No entanto, a produção não foi adiante devido à vida agitada. Mesmo assim, ela faz esboços de algumas cenas no bloco de notas do seu celular, o que fica reservado somente a ela.
   Outros estilos de fanfic que Madeleine gosta são de época vitoriana, crossover – que são histórias que se misturam com outras histórias – e enemies to lovers, que é quando contêm


casais que vão de inimigos a apaixonados um pelo outro. Mas nem só de fanfics e de histórias de romance vive Madeleine, seu gosto por leitura também inclui biografias e livros documentais. A estudante deixa claro que fanfic não é para qualquer um: “Como é uma coisa bem específica, se a pessoa tiver um pré-julgamento, ela não vai poder aproveitar a história ou vai ficar achando milhões de defeitos. Vale se você é fã de algo e gostaria de entrar em um universo paralelo, mas caso você não tenha essa paixão, eu acho que não é válido”.
   Nos últimos anos, o mercado literário e cinematográfico tem dado cada vez mais espaço às fanfics. Um exemplo é a famosa trilogia 50 Tons de Cinza. Madeleine acredita que isso seja positivo. “Eu acho muito bacana que essas histórias podem atingir mais pessoas a conhecer as autoras que estão aí de forma anônima, mas que são incríveis. É muito bacana acompanhar uma fanfic na Internet e depois ver ela com uma capa, dentro de uma livraria, com uma editora”.





Ana Clara Nazario

Madeleine Reis começou a ler quando criança e sempre foi apaixonada por romances, cinema e música

Foto: Madeleine Reis/Arquivo Pessoal

A opinião de profissionais

A transformação da leitura

   De acordo com a Doutora em Literatura Comparada, Cristina Loff Knapp, a migração de um estilo de leitura para outro é um processo natural, e sempre terá pessoas que gostam mais do impresso e outros mais do digital. A leitura em si está em constante transformação e as tecnologias também estão em transição, mudando a forma como processamos a linguagem e a leitura.
   Atualmente, muitos jovens estão criando gosto pela leitura digital e pelas interações que são possíveis fazer através da tecnologia. Um exemplo disso é o aplicativo Wattpad, que disponibiliza várias histórias, em formato de fanfics, para seus usuários poderem ler, além de permitir que eles também criem a sua própria história e compartilhem com outros usuários.





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Valdinéia Tosetto

Foto: Internet/Reprodução

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    Hoje o serviço conta com 100 milhões de download e, até setembro de 2020, o serviço contava com mais de 90 milhões de usuários mensais, 665 milhões de textos disponibilizados, e mais de 85% do tráfego a partir de dispositivos móveis, como tablets ou celulares - segundo dados do site Olhar Digital.
   Cristina relata que as fanfics estimulam a criatividade do leitor. “A interação na leitura é sempre muito boa e tudo isso estimula a criatividade da criança”, enfatiza, ao mesmo tempo em que explica que toda história tem a sua verossimilhança interna e podemos criar um novo final, mas não mudar a história totalmente.
   Independentemente se existe ou não a interação em uma leitura, se é realizada por meio de aparelho eletrônico ou do papel, ela sempre será importante para o indivíduo. E você? qual a sua a sua versão?








Foto: Valdinéia Tosetto/Reprodução

Doutora Cristina Loff Knapp diz que a migração de um estilo de leitura para outro é um processo natural

Reportagem realizada na Universidade de Caxias do Sul (UCS)

Disciplina Jornalismo e Convergência: Projeto Experimental I

Supervisão: professora Dra. Alessandra Paula Rech

Alunas: Alessandra Bernardi, Ana Clara Nazario e Valdinéia Tosetto